quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Greve geral em Pedome



Para início desta crónica, terei que assumir que ela se passa há mais de trinta anos, no tempo em que em Pedome ainda havia gente e actividade para fazer greve.

“Levantou-se o Manuel, já nem sequer era muito cedo, mas estava frio e o calor da cama sabia bem. Já passava das sete e meia, ligou o rádio e ficou espantado com a azáfama de notícias sobre uma tal greve geral.
Ficou então a ruminar porque não, ele próprio fazer greve. Sim, as coisas estavam mal o suficiente para se revoltar. O preço das jeiras nem dava para pagar o pão, o do centeio não pagava o adubo quanto mais o trabalho, as uvas nem sequer pagavam a vindima, o leite das vacas não dava para um saco de ração.
Pois muito bem, hoje faria greve. Não iria ganhar a jeira para o Luis, nem levaria as vacas para o pasto, não iria ferrar o macho, até porque o ferrador também iria fazer greve, certamente.
A mulher afoutou-lhe de baixo para o mata-bicho. Desceu, puxando as ceroulas para cima e ajeitando os carpins nos socos abertos.
Sentado à volta da lareira, a roer a côdea que molhava aos poucos no malga do café e afagava com um golo de bagaço, virou-se para a mulher e disse:
- Maria, hoje não dás de comer às pitas. Fazemos greve.
- Era só o que faltava, ainda vou para a consulta, tenho que apanhar a carreira, isto se o Norberto e o Santarém também não fizerem greve e o sr. Doutor também. Mas esse porque havia de fazer greve?
E depois, deixa-te de coisas Manel, dá lá de comer às pitas e leva as vacas para o lameiro, afinal de contas que culpa têm elas do estado das coisas?
Manuel engoliu o último bocado de pão, deu um arroto e não disse mais nada”

2 comentários:

Graça Gomes disse...

"E depois, deixa-te de coisas Manel, dá lá de comer às pitas e leva as vacas para o lameiro, afinal de contas que culpa têm elas do estado das coisas?"
Atitude sábia, a da Maria!
Eu faço minhas as suas palavras:
Afinal de contas que culpa temos nós do estado das coisas...

trepadeira disse...

Pois ontem foi só para dar de comer às pitas e aos piruns e berrar,berrar muito,até escorraçá-los.

Um abraço,
mário